As áreas de tecnologia da informação normalmente assumem riscos desnecessários devido a ausência de instrumentos para transferir ou compartilhar riscos com outras áreas. O desconhecimento desses processos e do conceito de risco aumenta o custo operacional e diminue a qualidade do serviço, pois necessitam administrar um estoque sempre crescente de problemas potenciais.
Risco é a possibilidade da ocorrência de eventos que causem perdas ou flutuações em receitas futuras. É tudo aquilo que pode gerar perdas para a organização tais como riscos de falhas em infraestruturas, problemas em aplicações, atrasos e quebras do orçamento de projetos, etc. Para minimizar o possível impacto financeiro, os manuais de gestão risco prescrevem metodologias de mitigação de risco. Mas a sua minimização ou eliminação muitas vezes não é tecnicamente ou financeiramente viável, e como os manuais de sobrevivência ensinam, se não é possível resolver um problema, transfira para o vizinho.
A transferência formal do risco ocorre quando uma parte contrata um terceiro para assumir ou dividir o risco. Um bom exemplo disso ocorre na terceirização de serviços de desenvolvimento de software ou na gestão de infraestrutura. No outsourcing, uma empresa especializada é capaz de lidar mais facilmente com o risco pois possui uma maior escala e conhecimento que a contratante.
O caso oposto ocorre quando não existe um relacionamento formal entre as partes. Este é o caso de consultas a especialistas dentro da organização. A apreciação por parte de um terceiro divide o risco técnico do projeto, da solução, e também o minimiza.
Em muitos casos, o risco é mais sutil e está presente na tomada de descisão diária. A compra de um novo equipamento ou software fora de um padrão, por exemplo, pode gerar um problema grave de arquitetura. O alinhamento prévio com o seu par, chefe ou colega divide o risco com a estrutura da empresa. O risco deixa de ser apenas do profissional, da área, do departamento e passa a ser de todos envolvidos no processo de comunicação.
Da mesma forma que faz sentido a transferência do risco para fora, é lógico rejeitá-lo ou criar dificuldades quando vem de fora. Muitas vezes as áreas de negócio aumentam o risco das áreas de tecnologia através de soluções adquiridas do mercado. Certa vez hospedei um servidor com uma solução tipo caixa-preta adquirida durante uma negociação com um cliente pela área comercial. Como não havia manutenção na aplicação, houve vários problemas de disponibilidade após a implementação do sistema. E naturalmente ninguém se lembrava de quem houvera comprado e forçado a implementação "guela abaixo" de TI. O produto foi desativado depois de uma série de tentativas sem sucesso de melhorar a arquitetura da solução e literalmente foi redesenhado. A área de negócio não estava ciente dos riscos operacionais ou não se importava com eles, pois após o fechamento do negócio, "o risco passou a ser da área de TI e não da área comercial". Na época, lamentei de não ter um meio para vincular a área comercial à solução e desejava algum instrumento que permitisse operar o produto mas ao mesmo tempo mantivesse o risco da solução com a área de negócio.
Memos de riscos, cartas de compliance ou cartas de riscos são instrumentos que formalizam e declaram para a organização o aumento do risco operacional devido ao descumprimento de um padrão ou norma. Se uma área de produtos desejar implementar uma solução que aumente em demasiado o risco, esta deverá assumir o risco e a área de TI deve emitir um documento contra a área que deve assinar e devolver a TI. Outra forma de não aceitar prontamente o risco é levá-lo em consideração na elaboração do SLA. Quanto maior o risco operacional, piores devem ser os níveis de serviço vendidos por TI.
Na verdade, o Risco Operacional é de toda a empresa. Assim a estratégia de transferir o risco parece ser um contra-senso pois o risco é corporativo e não de uma área, de um profissional. Mas é TI que absorve o primeiro impacto e responde por qualquer problema, da mesma forma que o jurídico responde por um problema legal ou o RH por um passivo trabalhista. Por sua vez, as áreas de negócio muitas vezes desconhecem os riscos tecnológicos ou comportam-se como tal. Transferir formalmente o risco as obriga a uma reavaliação interna do projeto, da idéia. E na eventualidade de um problema, as partes que "sabiam do risco" vão se voluntariar a resolvê-lo pois são sócias do empreendimento e de qualquer problema que venha a ocorrer.
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